Por Berna Almeida

crônicas -

O Calabouço


“Mas como trazer à tona uma vida que por mais que fale, ande, não está mais aqui?”

Nunca havia visto minha mãe tão desesperada como naquele dia. Cabelos em total desalinho, olhos vermelhos, fumegantes, e inchados pelas lágrimas incontidas. A abracei e pude sentir a saudade que ela trazia de sua mãezinha, vi que naquele momento a única pessoa que poderia secar lhe as lágrimas, era quem lhe concebeu um dia.

Mas como trazer à tona uma vida que por mais que fale, ande, não está mais aqui?


Como me transportar até a ela e lhe dizer:

– Mamãe, calma! Está tudo, está tudo bem!

Quanto mais eu a abraçava no intuito de consola-la, mas agressiva se tornava por não aceitar o descontentamento de que todos foram ao enterro da minha avó, e ela nem ao menos foi comunicada.

Senti em suas palavras, uma sentença porque a mãe era dela, e ninguém tinha o direito de omitir algo tão sério.

Vi em seus olhos naquele instante, que não era ela quem me afrontava e se rebelava diante da realidade, que eu queria lhe mostrar. Era 1 sujeito chamado Alzheimer.

Chorou por horas a fio a saudade da mãe, e eu de cá tentando convencê-la a entender, que a morte faz parte da vida, e que um dia elas iriam se encontrar.

Em vão…

Seu cérebro naquele dia, naquelas horas estava infiltrado nas lembranças tristes do passado, e eu era cobrada por isso.


Como entender que um cérebro doente, é quem domina um corpo que padece em busca de suas memórias?

Se jogo a corda, ela não sabe mais nem o que fazer com ela, e muito menos forças para se manter nas paredes do poço, até conseguir chegar aqui em cima….

Há momentos que precisamos descer ao poço para aconchega-los, mas a minha esperança era que passasse alguém e dissesse:

– Nós vamos retirar vocês deste calabouço!

Com o tempo, nossos gemidos e gritos de socorro se transformaram em ecos, só nós duas ouvíamos nossas vozes.

Ah se nós soubéssemos!!!

Ninguém é avisado do calabouço que o cotidiano nos colocará um dia…

Eu e ela, ela e eu, mas ninguém para entender o âmago de nossas almas. Foi preciso ir as profundezas rever a morte de minha avó mesmo sem a tê-la conhecido, para alcançar minha mãe segurar forte em suas mãos, dando-lhe a certeza de que ela não estava sozinha…

Eu estava lá, aliás eu sempre estive lá, até o dia que minha avó juntamente com Deus, decidiu estancar suas lágrimas de uma vez por todas, e acabar com a grande saudade que explodia em seu peito.



Autoria: Berna Almeida